quarta-feira, 8 de agosto de 2012

DECANO DO STF DIZ QUE PROVAS DE CPI NÃO VALEM


          Decano do Supremo Tribunal Federal, o ministro Celso de Mello afirmou que não vai aceitar, em seu voto no julgamento do mensalão, provas produzidas fora da instrução da ação penal, fase em que se ouvem testemunhas e coletam provas no âmbito do Judiciário. E citou, ao explicar sua posição, depoimentos dados a CPIs e à Polícia Federal.
          "A prova para a condenação tem que ter o direito ao contraditório. Pela lei, deve valer o princípio da bilateralidade. É diferente em uma CPI, que tem um caráter unilateral, inquisitório", disse Celso de Mello ao Estado, anteontem. "A jurisprudência do Supremo já entende assim e a reforma do Código de Processo Penal também. Não sou eu quem está dizendo."
           Desde 2008, um dos artigos do Código de Processo Penal foi alterado e passou a dizer que "o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas". Ou seja, a produção das provas em uma ação penal já deve contar com acusação e defesa.
            Teses. Esse é um dos pilares dos defensores do ex-ministro José Dirceu e de outros réus. Para eles, os pedidos de condenação feitos pelo procurador-geral, Roberto Gurgel, foram baseados em provas produzidas fora da ação penal, como depoimentos e relatórios da CPI e laudos da PF.
          A validade ou não de uma prova é crucial para decidir o futuro de um réu. Na segunda-feira, em entrevista ao Estado, o ministro Marco Aurélio Mello criticou a tese de que é preciso prova cabal para condenar um réu por corrupção. "O que vão querer em termos de provas? Uma carta? Uma confissão espontânea? É muito difícil", disse. No mesmo dia, advogados de defesa disseram que é preciso um "mínimo de provas" e que, em caso de dúvida, beneficia-se o réu.
        Sem antecipar o voto, Celso de Mello disse acreditar que o desfecho do julgamento seja bem diversificado. Advogados acreditam que alguns réus serão condenados à prisão, outros a prestação de serviços comunitários e alguns, absolvidos. "É possível", respondeu o ministro.
          Com o voto já escrito e detalhado por réu e por crime, o ministro não descarta alterações. "Já tenho convicções, mas ouço atentamente as sustentações porque tenho a mente aberta. Anoto e aguardo para ver se surge algum argumento jurídico novo.
Fonte: Estadão.

MENSALÃO; JULGAMENTO OU TEATRO?


       Ministros do Supremo Tribunal Federal consideraram a primeira safra de defesa dos réus de mensalão incapaz de derrubar a tese do Ministério Público de que o mensalão existiu e era chefiado pelo ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.
     Cinco ministros ouvidos reservadamente pelo Estado apontaram que o papel de Dirceu no esquema, mesmo sem prova material, foi caracterizado e que a versão do caixa 2 não se sustenta. Para que seja condenado, seis ministros precisam votar contra Dirceu. "O Zé Dirceu fazia navio voar", afirma um ministro do Supremo. "Se ele (Dirceu) for absolvido, sobe (a responsabilidade) para o Lula. O domínio era dele, é evidente que comandava."
      Para outro ministro, "ou você acredita que o esquema (mensalão) existiu ou não. Se acredita, é porque tem uma lógica e só tem lógica se você colocar o cérebro."
     'Sem cérebro'. Uma parcela do colegiado, embora veja falhas na acusação, avalia que, se Dirceu for inocentado, implode-se o esquema descrito pela Procuradoria-Geral. A absolvição de Dirceu, sustentam, quebraria qualquer lógica do sistema, deixaria o mensalão "sem cérebro". Apontado pelo procurador-geral como chefe de quadrilha e autor intelectual do mensalão, Dirceu baseia sua defesa na falta de provas de que teria montado ou ordenado a compra de apoio político valendo-se, segundo a acusação, de dinheiro público lavado por empréstimos bancários. Segundo os ministros, a defesa foi fraca ao não falar sobre os principais pontos que deverão balizar seu julgamento.
     O mesmo não ocorreu com o advogado Marcelo Leonardo, considerado por ministros como o autor da melhor sustentação oral de segunda-feira. "Ele não fugiu de nenhuma acusação", disse um ministro. Afirmando que não há provas de corrupção ativa de Dirceu, o advogado José Luís Oliveira Lima tentou desqualificar a acusação do MP, de que ele seria o autor intelectual do mensalão.
     "Não há nenhum depoimento que aponte corrupção ativa." Segundo os ministros, porém, a defesa deveria ter explorado a tese de que não há um ato de ofício de autoria de Dirceu, necessário para justificar condenação por corrupção ativa. Outra crítica à defesa é que não foi explorada a inimizade entre ele e o delator do esquema, Roberto Jefferson. Foi ele quem prestou depoimento e falou sobre a suposta participação do ex-ministro no esquema. Segundo os ministros, normalmente depoimentos de corréus, como Jefferson, têm peso relativo, ainda mais quando há inimizade. Em vez disso, Oliveira Lima afirmou que Jefferson estava acuado.
      Conforme um dos ministros, se Dirceu for absolvido, é preciso buscar a cabeça do esquema. Se não, o mensalão poderá ter surgido por "combustão espontânea", ironiza um ministro, que considera que o ex-presidente do PT José Genoino não tinha força para gerir o esquema que, segundo a Procuradoria, envolveu recursos públicos, negociações com a cúpula de partidos e partilha de cargos.
    Genoino afirmou que a responsabilidade recaía sobre o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, que também não teria autoridade para conduzir o esquema. Para ele, Dirceu estava mesmo à frente do mensalão "porque era um projeto de longo alcance, por muitos anos". Sem esse cérebro, diz um ministro, "a culpa sobe para o Lula." A dificuldade confessada pelo procurador-geral para produzir provas contra Dirceu foi relativizada. A lógica do sistema, a realidade política da época e as provas testemunhais, podem servir de argumento para a condenação.
Fonte: estadão